O real sacrifício

Nem feriado religioso é suficiente para a paz na Síria. O mediador internacional no país, Lakhdar Brahimi, havia proposto um cessar-fogo de quatro dias em respeito ao Eid al-Adha, festividade que sucede o hajj, a peregrinação à Meca. Muçulmanos de todo o mundo comemoram no feriado tanto a disposição de Ibrahim (ou Abraão) em sacrificar seu filho Ismael como ato de submissão a Allah, quanto a aceitação do filho, antes de Allah oferecer um cordeiro no lugar do sacrifício.

Não saiu exatamente o esperado: mais de 150 pessoas mortas no primeiro dia, 120 no segundo. Hoje, terceiro dia, aviões de guerra sírios e artilharias atacaram os subúrbios rebeldes de Arbeen, Harasta e Zamalka, a leste de Damasco, de acordo com Observatório Sírio de Direitos Humanos e Comitês de Coordenação Locais. Lutas também foram reportadas em cidades ao longo da rodovia Damasco-Aleppo, em que rebeldes sitiaram bases militares e atacaram comboios de suprimentos do governo. Forças aéreas sírias jogaram mísseis e bombas-barril em vilas perto da base. O governo acusa os rebeldes de terem violado o cessar-fogo desde o início, ao detonarem um carro bomba na frente de uma igreja cristã assíria em Deir el-Zour.

Era a primeira tentativa de trégua em seis meses em uma guerra que já matou mais de 35 mil pessoas em pouco mais de um ano e meio. Em anúncio lido na televisão estatal síria na quinta dia 25, o Exército disse aceitar a trégua com a ressalva de que responderia se fosse atacado por rebeldes, assim como tentaria impedi-los de reforçar posições e transportar suprimentos. No mesmo dia, o presidente Bashar al-Assad fez uma rara aparição pública ao rezar em uma mesquita de Damasco (quando o Sheikh Abdul-Haq disse: “É nossa responsabilidade hoje responder à mensagem do Profeta Mohammad… que é amar uns aos outros”).

No entanto, grupos da oposição rejeitaram a proposta por não confiarem nas promessas de Assad. Jabhat al-Nusra, um grupo rebelde inspirado na al-Qaeda, rejeitou a trégua de imediato. O líder da al-Qaeda, Ayman al-Zawahri, publicou um vídeo em que incita muçulmanos de todos os lugares a apoiarem a revolta síria.

O Guardian também trouxe choques entre rebeldes e curdos em Aleppo. De acordo com o líder do partido curdo Yekiti, os conflitos ocorreram depois que rebeldes entraram nas áreas curdas, desrespeitando um “acordo de cavalheiros” que mantinha tais áreas em relativa calma durante os três últimos meses. Ele também afirmou que havia desacordos entre o Exército Lívre Sírio e as Unidades de Defesa Populares Curdas. A etnia curda na síria não tomou partido; alguns se aliaram aos dissidentes, outros a Assad e outros permaneceram neutros. Dezenas de milhares de árabes têm fugido da violência em Aleppo para as regiões curdas.

Não existe diálogo entre Assad e a oposição síria, uma vez que os dissidentes se recusam a negociar antes que Assad saia do poder. O cessar fogo não durou três horas. Apesar de a tentativa de cessar-fogo ter ganhado apoio da Rússia, China e Irã, é por essas e outras que não são poucos os que defendem uma intervenção no país em crise. Clóvis Rossi reuniu em sua coluna argumentos publicados no Le Monde, The Economist e Financial Times para que haja alguma ação “antes que a acumulação de cadáveres gere tal ódio que torne o futuro sírio mais sombrio do que o presente.”

Mais
Egito | Ao menos 93 jovens foram detidos no Cairo na sexta-feira, dia 26, acusados de assediar sexualmente mulheres egípcias e estrangeiras. O primeiro-ministro Hisham Qandil anunciou que prepara um projeto de lei para aumentar as penas para tais casos. Voluntários lançaram  campanha “Eu vi assédio”, para denunciar casos durante o Eid al-Adha. A ativista Hala Mustafa lamenta o fato de policias não reagirem (ou agirem a favor do assédio) quando grupos de jovens assediam mulheres no centro da cidade. Mustafa também acha que o aumento do fenômeno se deve à violação dos direitos da mulher durante os anos de Mubarak e à extensão do pensamento conservador muçulmano wahabí, presente na Arábia Saudita, e que limita o papel da mulher a se casar e procriar. (El País)

Afeganistão | Atentado a mesquita no Afeganistão é atribuído a Taleban. Minutos antes do atentado, o presidente Hamid Karzi havia feito um discurso Cabul pedindo que o Taleban se unisse ao governo.Faltam ainda dois anos para o prazo final de retirada dos 100 mil membros das forças internacionais. (Folha)

Líbia | Foi em 20 de outubro de 2011 que Muammar Gaddafi foi capturado e morto. Um ano depois, a Líbia enfrenta profundas mudanças: a segurança tem melhorado na capital, mas o país não está estável e nem todos os rebeldes estão desarmados. A principal ameaça vem de milícias armadas e a luta atual está na cidade de Bani Walid, ex-baluarte de Gaddafi, onde milícias aliadas ao governo combatem grupos armados que se dizem leais ao ex-ditador. É meta do governo dissolver milícias que não estejam sob seu controle. (Al Jazeera)

Deixe um comentário